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Antes de Conor McGregor, havia Chael Sonnen. Em 2010, ninguém ocupava tanto as manchetes como o “Gângster de West Linn”, que ficou a 1m50s de derrotar Anderson Silva e conquistar o cinturão dos pesos-médios.
Foi uma das mais dramáticas e memoráveis disputas de título na história do MMA, e uma que ninguém conseguiu esquecer, muito menos um dos protagonistas.
“Eu me lembro também”, disse Sonnen, “Me lembro como se tivesse sido esta manhã”.
Vencendo por quatro rounds a zero, Sonnen estava superando o até então insuperável brasileiro a caminho de uma vitória chocante até que Anderson tirou uma finalização da cartola no último round.
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Foi uma derrota devastadora para Sonnen, mas ele conseguiu deixar o clima leve na coletiva de imprensa antes da revanche no UFC 148, dois anos depois, afirmando que não conhecia as regras e que achava que, caso desse os três tapinhas, teria apenas perdido o round, e não a luta. Perguntei a ele sobre esse momento, e, com o semblante sério, ele respondeu:
“Acontece que a luta inteira termina. Eu não sabia disso. É como se ninguém tivesse me avisado. Não sei realmente o que aconteceu. Não tenho ideia”.
Agora aos 43 anos de idade e mais ocupado do que nunca como comentarista da ESPN, sua organização Submission Underground e seu trabalho como proprietário da Bad Guy Inc., o ex-desafiante ao cinturão dos médios não perdeu em nada seu senso de humor e sua inteligência desde a última luta em 2019, e quando Ariel Helwani recentemente postou o vídeo da coletiva citado acima, todas as memórias de 2010 a 2012 afloraram, com o principal ponto sendo como ele criou todas essas frases clássicas.
“Muita coisa foi ensaiada”, ele admite, “Se você sabia que ia participar de algo, eu sempre me preparava. Algumas vezes meus críticos diziam, ‘Ah, ele planejou essa frase’. Como se eu tivesse em uma competição de inteligência em que precisava improvisar ou algo assim. Gente, eu nunca fui para uma prova sem estudar antes; Eu nunca fui para uma luta sem treinar. Eu sempre vou me preparar para tudo em que saiba quais são as condições. Sim, eu vou ter frases prontas. Pode apostar nisso”.
Ensaiado ou não, quando Sonnen começou a agredir Anderson verbalmente, se tornando o cara mais imitado nos negócios, ele cativou não apenas o mundo do MMA, mas o mundo dos esportes. E todo mundo, independentemente de amá-lo ou odiá-lo, passou a falar dele. Esse, como explica Sonnen, era exatamente o objetivo.
“É sempre difícil fazer alguém entender que isso é o esporte do MMA, mas é um negócio, é negócio e entretenimento”, disse, “Conor McGregor fez seu melhor trabalho fora do Octógono. Apenas para usá-lo como exemplo. Ele entendeu que isso é entretenimento e eu quero que as pessoas assistam, quero que as pessoas se importem e embarquem junto na jornada. Na sua cabeça, o único recurso de um lutador é sua performance, mas ele está errado, e um lutador também está errado se pensa que o melhor lugar em que pode chegar é o de campeão. Não é. O melhor lugar em que você pode chegar é onde o resultado não importa mais. Você pode vencer ou perder e ainda ser a luta principal e lotar a arena três meses depois, esse sim é um lugar especial. Mas a única maneira de chegar lá é fazer as pessoas embarcarem na jornada. Não é sobre socos ou chutes, é sobre a jornada”.
Sonnen perdeu sua primeira disputa de cinturão para Anderson em agosto de 2010. Ele lutou mais seis vezes no Octógono, disputando títulos mais duas vezes (na revanche com Anderson e com Jon Jones) e fazendo três lutas principais. Missão cumprida para o lutador que os fãs queriam ver, seja para vê-lo vencendo ou apanhando. No ponto de vista de Sonnen, independentemente de estar enfrentando o Spider, Jones, Michael Bisping, Brian Stann, Mauricio Shogun ou Rashad Evans, uma história estava lá, a reafirmação do ditado de que é preciso dois para fazer uma luta. E promover uma.
“Me lembro de quando estava na fase do Anderson e havia um ódio genuíno”, contou Sonnen, “Eu tentava explicar para ele quando não havia câmeras, ‘Eu sei que você não gosta de mim. Mas somos parceiros e vamos fazer negócios um dia. E ambos sabíamos as regras e o que estava em jogo, mas somos parceiros mesmo assim. Então se estou te atacando e isso está saindo nas manchetes e você pensa que a maneira de me mostrar o espírito das artes marciais é ficar quieto e não fazer nada, você está se esquecendo que somos parceiros. Estou prestes a mudar sua vida, e você, a minha. Podemos nos odiar o quanto quisermos, mas se não valorizarmos esse conceito, estamos deixando muito para trás. É difícil, porque por mais que isso faça sentido para mim, e sinto que estou sendo até eloquente falando, eles me vêem como um estranho. Não sabem o que estou dizendo”.
Sonnen sabia sobre negócios. Ele sabia como causar uma reação e sabia como se promover. Ele também era mais do que acessível à imprensa, algo que o grande Muhammad Ali sempre foi. Ali convidava repórteres para seu training camp e nunca viu um microfone ou papel e caneta que não gostasse. Sonnen repetiu essa filosofia, e apesar de não ter sido o primeiro no mundo esportivo a fazer o que fez, talvez tenha sido o primeiro a levar isso para o MMA.
“O mais importante foi eu ter sido o primeiro”, disse, “Eu sabia que outros caras já haviam feito isso antes - Steve Austin, e The Rock estavam lá, e você pode voltar até Muhammad Ali ou John McEnroe - então eu não reinventei a roda, mas, no nosso esporte, fui o primeiro”.
Ele talvez tenha sido o melhor também, até McGregor entrar em cena e tornar as coletivas de imprensa imperdíveis em seu caminho rumo às conquistas de dois cinturões no UFC. Sonnen observou o “Notório” trabalhando, mas explica que se os lutadores de hoje quiserem igualar os feitos do irlandês, precisam contar suas próprias histórias e trilharem seus próprios caminhos, e não copiá-los.
“Atenção é como um subproduto”, disse, “Seu objetivo é se destacar. É muito, muito difícil se destacar. Quando estamos todos no mesmo esporte, em divisões de peso semelhantes, sob as regras unificadas, como fazer as coisas de uma forma diferente? Acho que é nisso que as pessoas deveriam pensar, e quando você diz que um cara não pode ser outro Conor McGregor, você ficaria surpreso de ver quantos caras não entendem esse conceito. Conor começa vestindo ternos e gravatas borboleta. Agora, o mercado de gravatas borboleta foi tomado por ele. São as pequenas coisas, mas se você está tentando imitar algum outro cara… tem sempre uma maneira de te desmascarar. Você precisa esperar alguns anos e então fazer isso”.
Sonnen ri, mas esse é um negócio sério, e ouvi-lo falar sobre é um olhar fascinante para um dos melhores contadores de história que o esporte já viu. E esse é o segredo para ele. Contar a história, e o resto seguirá.
“Se eu tivesse duas mensagens, nenhuma delas seria para irem lá e provocarem”, disse, “Sei que fiquei famoso por isso, mas esse não era meu objetivo. Foi o que eu fiz para alcançar meu objetivo. O objetivo era, número um, contar uma história. Isso é a promoção. E número dois, entender que podemos estar no esporte de luta, mas estamos no negócio do entretenimento, então vá lá e entretenha as pessoas”.
Chael Sonnen nos entreteu por muitos anos, mas pode ter sido há 10 anos que ele realmente marcou o mundo das lutas. Então, como ele se lembra de 2010?
“Se eu tenho algum arrependimento do meu tempo no esporte, foi que eu nunca realmente aproveitei nada”, disse, “Eu penso nisso agora, ‘Como você não aproveitou aquilo?’. Era muito divertido, e minha namorada na época - que é minha esposa agora - ia comigo em tudo aquilo e temos muitas boas memórias. Mas, na época, eu não aproveitei. O esporte é muito estressante, o trabalho é extremamente duro, e em quanto mais direções você é puxado significa mais lugares aleatórios para achar uma academia para treinar, lugares aleatórios para comer, para dormir. Olhando para trás, sou muito grato e nunca percebi todas as oportunidades que tive, ou talvez algumas oportunidades que outras pessoas não tiveram. Eu pensava que todos tinham uma agenda parecida, e nunca aproveitei. Olho para trás agora, daria tudo para voltar em alguns daqueles lugares. Nunca percebi que experiência rara eu vivi, e que nunca acontecerá novamente”.