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Ele conversa de forma tranquila, sem pressa. Já ouviu muito trash talk (lembra de Colby Covington em 2017?) e genuinamente não se incomodou. Dentro do Octógono, assume uma frieza impressionante, mesmo diante dos mais incômodos apuros. O paulistano Demian Maia é, sem dúvida alguma, um dos lutadores mais zen do UFC. Mas nem sempre foi assim.
Parece impossível acreditar, mas Demian conta que era uma criança difícil. “Quando eu era pequeno, com uns 6 anos, por incrível que pareça, era bem agressivo, brigava muito”, ele diz. Nessa época, enfrentava turbulências em casa com a separação dos pais e outros problemas familiares. Descontava liberando a agressividade. O que o fez mudar? A disciplina das artes marciais.
“Comecei a treinar de forma mais séria aos 12 anos e essa mentalidade de arte marcial foi incutida em mim desde então. Aquela filosofia de manter a calma, de não deixar a emoção tomar conta, de conseguir ser mais racional, de ter respeito outros e evitar agressão foi me moldando.” Demian teve um breve contato com o judô dos 5 aos 7 anos e, mais tarde, aos 12, praticou com mais consistência kung fu, jiu-jítsu e caratê.
Aos 41 anos, Demian faz a 36ª luta de seu cartel neste sábado no UFC Minneapolis, contra o americano Anthony Rocco Martin, de 29. Foi lá dos Estados Unidos que ele conversou conosco e contou como mantém seu equilíbrio mental. Do papo, extraí três lições, que podem ser úteis para nós mesmos enfrentarmos o estresse de nossas vidas:
1) Práticas como ioga ajudam, mas o segredo está em sua rotina
Para manter-se equilibrado tanto no preparo para a luta quanto no dia a dia, Demian já fez uso de práticas como ioga e meditação – à qual vem recorrendo nos últimos dois anos –, mas acredita que o segredo não reside apenas aí. Demian não consegue dissociar o treino mental do próprio treino de luta. “Não adianta fazer ioga, meditação e na hora da luta perder o foco. O que eu vou fazer é lutar, então tenho que estar preparado para manter minha concentração no momento que mais isso se faz necessário, que é no combate”, afirma o atleta. “Não dá para separar muito as coisas, pensar que cada uma fica em uma gaveta.”
2) Não pensar no problema não é a solução – e nem pensar demais nele
Para o lutador paulistano, o momento mais tenso de toda a preparação é exatamente o intervalo em que nada acontece entre a hora em que ele acorda no dia do evento e o trajeto até a arena onde ele vai acontecer. “Quando a gente chega no ginásio, aquece e tem aquela rotina toda, isso já vai nos botando no modo de luta. Mas, quando estamos no hotel, esperando, é um muito tenso. É aquela história de você ficar ali só dentro da sua cabeça, sabe? É maçante, especialmente se a gente se deixa levar e começa a pensar em possibilidades. Quando deixa a cabeça enganar e começa a ficar martelando: mas e aí? E se perder?”
O atleta conta que, para manter o equilíbrio em situações de ansiedade assim, aprendeu – e fica aqui a dica para todos nós – que não adianta ignorar o que está prestes a acontecer e fingir que a situação estressante não existe. “Não pensar nada acaba sendo um escapismo que não adianta. É preciso pensar sobre o que vai acontecer, mas sem o tal overthinking, sem pensar demais. É preciso dar uma relaxada, tirar um pouco o foco daquilo, conversar com a equipe, mudar de assunto.”
3) Lidar com a frustração é mais leve quando temos a consciência tranquila
E quando vem a derrota? Não tem jeito, diz Demian, a primeira emoção é de frustração total e a primeira atitude, a de remoer-se. “Como atleta de alto rendimento, a vitória é uma das coisas mais importantes da sua vida. Perder uma luta é uma coisa muito difícil, quase um velório”, conta ele. “O que percebi é que, se entreguei tudo o que podia, que não é 100%, é mais do que isso, e mesmo assim perdi a luta, até fico triste, mas um pouco mais tranquilo. Mas, se perdi achando que podia ter feito melhor, é muito pior. Bate a culpa também.”
Demian se descreve como uma pessoa que tem muita vontade de vencer – e faz o que pode para isso. “Mas hoje sou muito mais equilibrado e consigo controlar bastante a emoção e lutar com bastante frieza. Encaro a luta como um problema que eu tenho que resolver, e não como uma pessoa em quem tenho que bater.”
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