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Blog do Marcelo Alonso

Kron Gracie e Vicente Luque roubam a noite de Velásquez em Phoenix

Os fãs norte-americanos que lotaram a Talking Resort arena em Phoenix no último domingo para ver a volta do ídolo local e ex-campeão dos pesados Cain Velasquez, acabaram voltando para casa decepcionados com a atuação do maior peso-pesado da história do UFC, que acabou sendo nocauteado em apenas 26 segundos pelo camaronês Francis Ngannou.

Veja também: Personalidades comentam estreia de Kron Gracie | As reações ao nocaute de Ngannou

Quem acabou roubando a noite foram os brasileiros Kron Gracie e Vicente Luque. O filho de Rickson Gracie estreou no maior evento do mundo finalizando Alex Caceres em pouco mais de dois minutos recebendo 50 mil dólares de bônus pela Performance da Noite, enquanto Luque foi premiado com o mesmo valor pela Luta da Noite. Uma virada a seis segundos do final, que tem tudo para concorrer ao prêmio de Luta do Ano no Oscar do MMA de 2019.

Três caminhos para Cormier: vingar o amigo, Lesnar ou Jones?

Claramente impactado pela ferrugem decorrente dos 31 meses afastado do Octógono, Cain Velasquez surpreendeu na luta principal da noite, ao partir para cima do gigante camaronês Francis Ngannou assim que o combate iniciou. Já na primeira troca de golpes, o atleta da AKA foi acertado de raspão por um uppercut e, tentando se equilibrar, torceu o joelho caindo imediatamente e obrigando o árbitro Jason Herzog a interromper a luta, decretando o nocaute técnico.

Se por um lado a derrota de Cain foi uma ducha de água fria para os planos do UFC de trazer mais emoção ao topo da divisão dos pesados, por outro possibilitou uma narrativa que costuma dar resultados nas vendas de pay per view: a boa e velha “vingança do amigo”.

O problema é que esta narrativa impactaria diretamente nos planos de aposentadoria do campeão Daniel Cormier, que planejava fazer sua última luta antes do aniversário de 40 anos em março. Se seu parceiro de treinos vencesse no sábado, Cormier poderia, tranquilamente, fazer sua última luta com Brock Lesnar, ou talvez até adiar a aposentadoria com uma histórica despedida contra o maior rival, Jon Jones. Mas diante da derrota acachapante do parceiro, DC acabou vendo a fila de desafiantes aumentar após Ngannou desafiá-lo na press conference logo após o evento em Phoenix. Obviamente, na posição que se encontra, Cormier pode muito bem escolher seus últimos oponentes, mas todos sabem que estando em plena forma e com o espírito competitivo que tem dificilmente conseguirá pendurar as luvas antes de lutar com seu único algoz e vingar o homem que destronou seu principal parceiro de treinos. Agora cabe aos fãs torcerem para que a proposta do UFC seduza o maior peso pesado da atualidade a adiar por mais um ano sua aposentadoria.

Nos passos de Rickson Gracie

Ser filho do número um da família Gracie nos anos 80 e 90 nunca impactou na carreira de Kron Gracie. Na realidade, a pressão por ser o filho de Rickson Gracie só fez Kron se dedicar ainda mais aos treinos. Os resultados vieram primeiro nos tatames, onde Kron se sagrou campeão mundial na faixa-marrom finalizando todas as lutas, com o avô Hélio e o pai Rickson assistindo da beira do tatame. Depois, já de faixa-preta, Kron venceu o ADCC na categoria até 77kgs em Pequim (2013). Em 2014, Kron resolveu seguir os passos do pai também nos ringues. Em dois anos, fez quatro lutas nos ringues japoneses e, após conseguir quatro finalizações, decidiu se testar no maior palco do MMA mundial, o UFC.

O adversário escolhido foi o experiente Alex Caceres, que só no UFC já tinha quase cinco vezes mais lutas que Kron (19). Mesmo assim, não deu nem para o começo.

Com um jogo muito parecido com Demian Maia, certamente desenvolvido nos treinos com os irmãos Diaz, o Gracie não teve dificuldades para encurtar, pegar as costas de Cáceres ainda de pé e definir a luta com um mata-leão aos 2m06s do 1º round. Com a vitória, o filho de Rickson acabou com a escrita de que um Gracie não vencia há 25 anos no octógono, desde que Royce venceu o UFC 4 (Rolls, Renzo e Roger perderam suas lutas na seqüência), e ainda faturou o prêmio de Performance da Noite, 50 mil dólares. Em entrevista após a luta, o brasileiro pediu a chance de lutar no UFC 237 em Curitiba (11 de maio) [data e local ainda não confirmados] e deixou os fãs brasileiros alvoroçados com a possibilidade.

Sem dúvida alguma o filho de Rickson pode representar uma boa surpresa para os fãs brasileiros na divisão dos penas futuramente. Com a já noticiada aposentadoria de José Aldo ao fim do ano, ficaremos basicamente com Renato Moicano no topo da divisão. Mas vale lembrar que esta é uma das categoria mais concorridas do esporte, e recheada de wrestlers nocauteadores com ótimas defesas de queda. Por mais que tenhamos um Demian Maia provando que o jiu-jítsu “quase puro” pode ser eficiente, a grande maioria dos faixas-preta de alto nível, como Werdum, Jacaré e Brian Ortega só conseguiram chegar ao topo de suas divisões adicionando alguma nova arte de luta em pé ao seu cardápio como lutadores de MMA. O próprio Demian só conseguiu desenvolver seu jogo treinando muito wrestling.

Até chegar em um Mirsad Bektic ou Alexander Volkanovski, Kron precisará diversificar seus treinos, além de contar com o bom senso de seu empresário no aumento paulatino do nível dos oponentes.

A virada antológica de Vicente Luque

Com sete vitórias em oito lutas, Vicente Luque chegou a Phoenix com duas motivações: acabar com a escrita de “inocauteável” de Bryan Barberena e, se possível, não se machucar muito na luta para poder chegar de cara limpa no casamento com a noiva Carolina em Brasília no dia 16 de março.

Luque acabou não cumprindo a segunda promessa, em compensação recebeu uma senhora ajudinha para a lua de mel: 50 mil dólares como prêmio pela Luta da Noite.

Depois de vencer com sobras o primeiro round, o brasileiro caiu de rendimento no segundo, quando recebeu muitos golpes na cabeça, permitindo o empate do resistente Barbarena. Apoiado por sua torcida, o norte-americano voltou para o terceiro round com o mesmo plano tático e continuou acertando mais golpes em Vicente. A luta parecia definida quando foi dado o sinal de 10 segundos para o final do combate e o brasileiro resolveu tentar uma joelhada a partir do clinch, que acertou em cheio o queixo de Barberena. Uma segunda joelhada seguida de socos, com o americano já ajoelhado, obrigou o árbitro Jason Herzog a decretar o nocaute técnico. Uma virada que pode garantir ao brasileiro um merecido lugar entre os Top 15 do ranking, além de um lugar entre os concorrentes a luta do ano no Oscar do MMA de 2019.

Psicologia não é frescura!

A nota negativa para os fãs brasileiros neste evento foi a quarta derrota consecutiva do ex-campeão dos galos Renan Barão.

Dediquei um dos meus primeiros artigos aqui neste blog para falar sobre a importância do psicólogo para lutadores. Minha inspiração havia sido a terceira derrota de Renan Barão, após a traumática revanche contra TJ Dilashaw. Ontem, mais uma vez o Potiguar, que já foi campeão e chegou a ser apontado por Dana White em 2013 como maior lutador peso-por-peso do esporte, ao lado de Jon Jones, voltou a mostrar ao mundo do MMA que um trauma pode sim impactar na performance de um atleta. Se isso acontece na Fórmula 1 após um acidente, ou no futebol após o atleta sofrer uma contusão grave, por que não aconteceria no esporte mais traumático que existe?

Este é definitivamente um assunto que precisa começar a ser encarado com seriedade no MMA. É hora de os lutadores entenderem que o apoio de um profissional da área de psicologia não é frescura ou demonstração de fraqueza. Como bem disse Pedro Rizzo neste artigo publicada aqui no blog em 2018, “O cérebro talvez seja o órgão mais complexo do ser humano. Se não temos vergonha de buscar auxílio para todos os outros, não faz sentido que tenhamos para curar os males da mente”.

O caso Barão é emblemático. Até ele reconhecia o trauma após as duas derrotas para TJ, os profissionais a sua volta também. Então por que deixar que um atleta, que certamente está entre os três maiores pesos-galo da história do MMA, continuasse perdendo suas lutas ao ponto de perder o emprego, como deve ocorrer após novamente não bater o peso e ainda ser nocauteado por Luke Saunders no último domingo?

O fato é que Barão tem apenas 32 anos. Com o currículo que tem, certamente terá espaço em outras organizações. Mas fica a torcida para que seu caso sirva como exemplo para a evolução do MMA. Que a partir de agora grandes equipes e atletas de ponta passem a ter o psicólogo como parte de seu staff assim como nutricionistas, fisioterapeutas e preparadores físicos.

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