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Não deixe para amanhã

Como a ciência e o treinador Diego Lima podem ajudá-lo a enfrentar a procrastinação

Há três semanas eu tento escrever este texto. Toda vez que sento à frente do computador, me deparo com alguma coisa mais urgente – ou apenas que me pareça mais prazerosa, mesmo que mais irresponsável (desculpa a sinceridade, editor!), como assistir ao último episódio da minha atual série favorita na Netflix. Isso tem nome, e ele é feio: procrastinação. É aquela ilusão da vitória fácil: você compromete o sucesso a longo prazo em benefício do prazer imediato. E demora a engatar.

Segundo um artigo que li recentemente no Harvard Business Review, o ato de adiar as tarefas é ardiloso e tem muitos disfarces. “Nós podemos decidir resolver uma questão, mas encontramos razões infinitas para adiá-la”, afirma Caroline Webb, autora do livro How to Have a Good Day: Harness the Power of Behavioral Science to Transform Your Working Life (em tradução livre, Como ter um bom dia: aproveite o poder da ciência comportamental para transformar sua vida profissional) e conselheira sênior da McKinsey & Company.

“Podemos priorizar coisas que prontamente marcamos em nossa lista de tarefas – responder a e-mails, digamos – enquanto deixamos as coisas grandes e complexas para outro dia. Podemos parecer e nos sentir ocupados enquanto evitamos habilmente as tarefas que realmente importam”, diz a especialista. “E, quando olhamos para esses itens longos e intocados no fim de nossa lista de tarefas, não podemos deixar de nos sentir um pouco desapontados.”

O problema é simples: nosso cérebro está programado para procrastinar. Isso porque é mais fácil para ele processar coisas concretas (tarefas simples que resolvemos em um piscar de olhos) do que as abstratas – a recompensa que só virá futuramente com as tarefas mais complexas, que são exatamente as que procrastinamos. Para combater isso, precisamos reequilibrar essa análise de custo-benefício: fazer as benesses das ações parecerem maiores e os custos, menores. “A recompensa por fazer uma tarefa perturbadora precisa ser maior do que a dor imediata de enfrentá-la”, explica Caroline.

O treinador Diego Lima, da Chute Boxe de São Paulo, ajuda constantemente seus pupilos a lutar contra a procrastinação. Ele e a ciência mostram aqui como é possível fazer o mesmo com a sua vida:

  • Visualize os benefícios de ter a tarefa pronta

Pesquisadores descobriram que as pessoas estão mais propensas a guardar dinheiro para a aposentadoria quando mostram a elas fotografias delas mesmas envelhecidas digitalmente. Isso faz com que o futuro pareça mais real e o benefício futuro da poupança, mais palpável. A ideia para parar de procrastinar é, portanto, aplicar essa técnica a outras situações, como imaginar como ficaria sua sala com a pintura nova – e, assim, começar hoje mesmo a pintá-la. É o que faz Diego Lima com seus atletas na Chute Boxe. “No começo do ano é muito fácil procrastinar. As pessoas vêm de uma carga pesada do ano anterior e acabam começando o novo bem devagar.Aqui, mostro para meus atletas que a gente fez um bom trabalho, conquistamos muitas coisas, e que para conquistar mais precisamos começar o ano muito melhor do que começamos no ano passado”, diz ele. “O dia de amanhã vai ser mais difícil. Quanto mais em evidência estivermos, mais vitórias acumularmos, mais vamos ser alvo dos adversários e mais precisamos estar preparados. Terminamos o ano já com duas lutas marcadas para o ano seguinte e isso fez com que todos ficássemos já ansiosos para voltar e treinar.”

  • Comprometa-se publicamente

Dizer em alto e bom tom que você pretende fazer determinada coisa amplia fortemente seu poder de realmente realizar aquilo, porque o sistema de recompensa de nosso cérebro é responsivo à posição social. Pesquisas mostram que é importante para nós saber que somos respeitados pelos outros, mesmo que por estranhos – por isso não queremos parecer bobos ou preguiçosos. Isso funciona enormemente com atletas. Ao ter um combate anunciado para determinado dia, com tal adversário, o lutador sente-se na obrigação de dar o melhor de si para não decepcionar os fãs e sua equipe. Assim, vislumbra benefícios sociais para cumprir sua tarefa.

  • Pense no lado negativo de não fazer nada

A ciência descobriu também que, apesar de conseguirmos pesar prós e contras de fazer determinada tarefa, não costumamos considerar os benefícios e os males de não a fazermos. E isso nos leva a ignorar coisas óbvias boas, mas que não tínhamos levado em conta, de não adiar o que deveríamos ter feito. Pegue meu caso como exemplo: estava constantemente adiando o início deste texto, pensando em como o último capítulo que havia visto de You (“Você”, na tradução desnecessária da Netflix) tinha terminado e em que o maluco do Joe aprontaria em seguida. Li então o conselho de Caroline Webb que eu deveria dizer a mim mesma que, sim, poderia deixar o texto para amanhã, mas para isso deveria me obrigar a pensar sobre o lado negativo de adiá-lo. Foi o que fiz: se eu procrastinasse mais, acumularia a entrega de outro texto. E se, por outro lado, eu me obrigasse a trabalhar agora, poderia usar amanhã de manhã para apurar meu novo texto e teria a tarde toda livre para assistir à série. Foi assim que, finalmente, consegui entregar isso que você lê agora (viu só, editor?).

  • Dê o primeiro passo

Às vezes, a meta é tão grande que você pode achar impossível chegar lá, por isso não começa a caminhar. Diego Lima, por exemplo, queria ser dono de academia. Ao não se intimidar com o objetivo, ele resolveu dar o primeiro passo: começar a trabalhar em uma. “Dou aula nesta academia do Morumbi há 18 anos”, conta. “Só há três consegui ser dono dela. Levei 15 anos para isso, mas desde o primeiro dia pensei que ela seria minha. O trabalho não foi da noite do dia. Claro, o primeiro passo é essencial. Mas não tem motivo para nossa meta final ser baixa.”

  • Gerencie suas emoções, não seu tempo

Muita gente não consegue parar de procrastinar porque a trata como se fosse um problema de produtividade, e esquece que a batalha mesmo acontece na nossa mente – e não na agenda. Uma pesquisa da DePaul University, de Chicago, mostra que procrastinamos quando nosso cérebro fica sobrecarregado de emoções conflitantes, como medo do fracasso, impulsividade (fazemos as coisas mais legais em detrimento de outras que podem ser mais importantes), negação (quando não gostamos do que temos que fazer), rebeldia (resistência a tarefas que obrigados a realizar). Muitos estudos mostram que emoções negativas, como tristeza ou aborrecimento, provocam esse adiamento – o prazer de qualquer distração nos parece mais bacana. “Sempre digo para meus atletas que o humor interfere nas tarefas e que uma cabeça blindada faz da gente campeão”, afirma Diego Lima. “É aquilo: nosso principal inimigo somos nós mesmos. A cabeça é que define 80% do resultado do atleta.” A melhor forma de vencer a procrastinação é, portanto, começar agora. Neste momento. Dê o pontapé inicial fazendo o que gosta menos (ou com o que mais ama). Desmembre as tarefas maiores em pequenas coisas e resolva uma por uma. Crie prazos mentais e os siga. Escreva a primeira palavra – que o resto do texto vem. Funcionou para mim. Mereço os parabéns, editor?