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Blog do Marcelo Alonso

Porque acreditar que Joanna e Romero serão campeões

Por mais tempo que você o acompanhe e por mais que tente se basear em fatos e dados estatísticos, é praticamente impossível não ser surpreendido semanalmente neste maravilhoso esporte chamado MMA.

Se no sábado passado cravei meu palpite na luta principal do UFC Norfolk (nocaute de Deiveson Figueiredo no 2º round), na segunda-feira errei feio na minha aposta para o futuro da categoria aqui no blog. Não acertei nem a revanche entre Formiga x Deiveson valendo o cinturão, nem muito menos (graças a Deus) a segunda possibilidade: o fim da divisão dos moscas. A confirmação partiu do próprio Dana White que, em conversa com a imprensa, na ultima quarta-feira, disse que deverá mesmo fazer Deiveson x Benavidez 2 para definir o campeão da divisão. Para mim uma enorme surpresa, dada a maneira dominante com que o brasileiro conseguiu o nocaute. 

Apesar de me incomodar a maneira patriótica com que parte da imprensa americana tem tratado o caso, dando muito valor à cabeçada e à vantagem de 1 Kg que o brasileiro conseguiu na balança, confesso que passei a entender melhor a narrativa escolhida por Dana White ao ver a análise de Vitor Miranda em seu último “De olho na Luta”. Até então, não tinha conseguido ver a tal cabeçada durante a luta. Além de não ser intencional, o golpe ilegal foi aplicado pelo próprio Benavidez. Não há como deixar de reconhecer que o americano se desconcentrou ao perceber o sangue escorrendo e foi exatamente neste momento que o brasileiro conectou o golpe derradeiro. Mas obviamente o fato de a ação ter sido provocada pelo próprio americano, descarta totalmente qualquer possibilidade de mudança no resultado da luta para um “no-contest”.

Tendo em vista este fato, a força de Benavidez junto ao público americano e a narrativa da “volta por cima” - que vende lutas como nenhuma outra - dá pra entender perfeitamente a decisão do cartola.

Mas há de se levar em conta ainda a importância do fator psicológico numa revanche como esta. Por mais casca-grossa que seja Benavidez, MMA não é videogame. O impacto psicológico de um nocaute não costuma ser apagado em 3 ou 4 meses. Exemplos como Namajunas, Garbrandt, Renan Barão e tantos outros mostram, na prática, que um ser humano precisa de tempo para trabalhar seus demônios. E nem sempre consegue domá-los.

A boa notícia é que a categoria dos moscas continua mais forte do que nunca e que, se a nutricionista de Deiveson seguir a cartilha da profissional contratada por José Aldo, o Brasil terá chances gigantes de, finalmente, voltar a ter um cinturão masculino ainda em 2020. 

UFC 248: Uma combinação que Adesanya nunca enfrentou

A julgar pelo impressionante nocaute que conseguiu contra Robert Whittaker e pelas excelentes exibições contra Kelvin Gastelum e Anderson Silva, dá para entender o favoritismo absoluto (quase 3 x 1) do campeão Israel Adesanya nas casas de apostas. Se formos levar em conta ainda a narrativa ideal de uma aguardada luta com o arqui-rival Paulo Borrachinha, não há como deixar de considerar Yoel Romero como uma zebra. Mais que isso. Uma vitória do cubano, que vem de 3 derrotas consecutivas, seria um total anti-clímax para a narrativa da divisão. Mas o fato é que no esporte mais duro e imprevisível que existe nem sempre a melhor história prevalece.

Deixando a ficção de lado, pessoalmente vejo Romero como favorito. Por mais que tenha vencido alguns dos maiores nomes da divisão, Adesanya ainda não foi testado contra um lutador que tenha tamanha capacidade de expor seu ponto fraco (defesa de quedas e lutar com as costas no solo). Sabemos que Romero, até por conta de sua idade avançada (42 anos) e da necessidade de oxigenação de sua enorme massa muscular, raramente usa sua principal arma no MMA, o wrestling. Um raciocínio que faz todo sentido contra oponentes igualmente fortes e com boas defesas de queda, como Borrachinha, Jacaré e Whittaker, mas que beiraria a insanidade contra um striker do nível de Adesanya, que sabidamente tem brechas nas defesas de queda. Principalmente a partir do clinche na grade.

Vale lembrar que usar o wrestling não significa necessariamente tentar a qualquer custo derrubar o oponente e morrer no gás. Para um atleta olímpico do nível do cubano, basta manter na cabeça do oponente a “ameaça constante” da queda para obrigá-lo a lutar diferente. Para isso Romero teria que alternar seu já imprevisível jogo em pé, com muitas fintas e entradas de queda sempre que o nigeriano tentasse chutá-lo ou andar pra frente. E sabemos que quando wrestlers olímpicos como Cejudo, Romero e Cormier decidem usar sua principal arma, obviamente os strikers que os enfrentam passam a dosar muito mais seu instinto ofensivo e acabam se expondo. É ou não é com esta receita que Khabib Nurmagomedov se consagrou como o atleta mais dominante do UFC na atualidade? Que o diga o próprio Conor McGregor que de tão preocupado com as quedas chegou a levar knock down do russo. Esta semana, aliás, Khabib fez questão de tietar o ídolo Romero. “Lembra de mim? Eu fui te assistir lutar no Daguestão quando tinha ainda 14 anos”. Obviamente Romero, que já era uma lenda do wrestling na época, não lembrou, mas aproveitou pra tirar uma foto com o campeão e gravar uma mensagem de vídeo para um antigo parceiro de treinos local, devidamente traduzida pelo fã Nurmagomedov.

Sabemos que a movimentação genial de Adesanya e sua vantagem na envergadura acaba atuando como principal defesa as quedas, mas dada a imprevisibilidade e o excelente sistema defensivo do cubano é muito provável que ele consiga encurralá-lo na grade fechando seu temido body lock.

Na luta contra Gastelum vimos que além de ser “derrubável”, o nigeriano não tem o que podemos chamar de “queixo de granito”, tanto que a luta só foi definida no 5º round. 

Obviamente há de se considerar que o cubano vem de 3 guerras de 13 rounds com Paulo Borrachinha e Robert Whitaker (2 lutas de 5 rounds). É obvio que seu corpo, além da desaceleração natural dos 42 anos, também tem marcas destas batalhas que se refletem na rotina de treinos e nas lutas subseqüentes. Se Adesanya conseguir frustrar as quedas de Yoel, usando sua envergadura e precisão para aplicar seu temido volume de golpes, tem todas as chances de manter seu cinturão, mas a minha aposta é que o cubano não queira fazer uma luta de kickboxing com um dos melhores strikers da história do UFC. Se tiver disciplina tática para mesclar atleticismo, poder de nocaute e wrestling, acredito que consiga seu sétimo nocaute técnico no 3º ou 4º rounds, ou uma vitória por pontos.  

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Joanna x Zhang: volume x poder de nocaute

No evento co-principal, que vai valer o cinturão peso-palha feminino, mais uma vez teremos um confronto entre uma striker diferenciada com ampla vantagem na envergadura e muita experiência no kickboxing (a desafiante Joanna Jedrzejcyk) e uma lutadora mais explosiva, imprevisível e com maior poder de nocaute (a campeã Weili Zhang).

Nesta luta, porém, acredito que a striker polonesa tenha mais condições de usar sua experiência e volume incessante de golpes para levar a luta até o final e vencer por pontos, como fez com Jessica Andrade.

Por falar na brasileira, que aliás comentará a luta no Combate, Jessica conheceu o poder de nocaute da chinesa em sua última luta, quando perdeu o cinturão das palhas e mostrou um caminho que a polonesa não pode fazer em hipótese alguma: partir para a luta franca. Se cometer este erro, como fez a brasileira, tem grandes chances de nocautear.

Assim como Yoel Romero, Zhang não pode deixar a polonesa totalmente à vontade numa luta de kickboxing. Se conseguir usar sua maior velocidade para mesclar ataques na curta com entradas de queda, a chinesa pode complicar a ex-campeã, mas caso Joanna use sua experiência e movimentação para manter a chinesa na distância ideal, possivelmente conseguirá vencer mais rounds, levando o cinturão de volta para a ATT.

O fato é que ambas disputas de cinturão deste UFC 248 são extremamente parelhas e têm todos os ingredientes para figurarem entre as melhores, e mais imprevisíveis, lutas deste ano de 2020.