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Profissão repórter: parte 2

No segundo e último episódio de nossa série em celebração ao Dia do Repórter, três outros jornalistas contam suas lembranças mais insólitas de coberturas de UFC

Na primeira parte do especial 'Dia Nacional do Reporter', Marcelo Alonso, Ana Hissa e Cláudia de Castro Lima - essa que aqui vos fala - contaram as histórias mais inusitadas que já viveram em coberturas do UFC. Clique aqui para ler "Profissão Repórter: Parte 1".

Confira mais alguns causos, agora nas palavras de outros três jornalistas especializados em MMA.

Evelyn Rodrigues, correspondente da Globo, SporTV e Canal Combate em Las Vegas

História 1: “Há três anos, o Jorginho Filho, que era um gari que foi indicado para o Oscar do MMA [o MMA Awards] como o Melhor Nocaute do Ano, veio para Vegas depois de uma campanha no Brasil para ele participar da cerimônia. Quando ele chegou, o conheci e ele foi contar a história dele. Marcamos de fazer a entrevista na frente do MGM para ele contar que tinha acabado de chegar. Engraçado que ele quis gravar a matéria usando a roupa de gari, porque ele tem muito orgulho, e quis falar sobre a rotina dele. No meio da gravação, ele menciona que o ídolo dele no esporte é o Anderson Silva. Lembrei que, por acaso, naquele dia o Anderson estava dando autógrafos em uma loja de roupas como parte da Fight Week [eventos programados para a semana da luta]. Não tive tempo de fazer pré-produção disso, mas perguntei: ‘Você quer conhecer o Anderson? A gente pode tentar ir lá e ver o que dá’. Não tinha nada planejado. Chegamos e estava uma fila gigantesca. Fiquei desesperada. Chamei o segurança, expliquei que era da imprensa e ele me botou pra dentro. Lá, encontrei o Ed Soares, empresário do Anderson, e falei que estava com o Jorginho. Contei a história toda, que ele fã do Anderson e também vinha do taekwondo. Ed falou: ‘Traz esse menino aqui’. Fomos pra frente da fila e ficamos aguardando. Foi muito emocionante quando o Anderson viu o Jorginho. Ele veio, abraçou o lutador, pegou a bandeira do Brasil, mandou um recado para ele nunca desistir dos sonhos dele. O Anderson nem ia lutar naquele fim de semana, mas ficou tão empolgado que perguntou pro Jorginho se ele ia assistir ao UFC. Ele disse que não, que nunca tinha visto um UFC na vida. Anderson então conseguiu um par de ingressos para ele. E eu fui acompanhar o Jorginho na saga de pegar o par de ingresso e no dia do UFC, quando ele viu pela primeira vez o evento ao vivo. Foi um momento muito legal. A gente que trabalha com jornalismo sabe quantas vezes temos que marcar uma entrevista com muito tempo de antecedência, estamos superacostumados a tomar chá de cadeira. E chegar numa lenda como o Andeson, sem ter planejado, sem ter falado nada, e ver essa resposta dele me tocou demais.”

Brasil

História 2: “Outro momento incrível que talvez seja legal mostrar é que, certa vez, eu estava cobrindo um UFC e recebi uma mensagem do Lucas Pires, manager do Fabricio Werdum, me perguntando o que eu estava fazendo. Disse que estava me preparando para ir para a coletiva de imprensa do UFC. Ele falou: ‘Werdum tá aqui em Vegas fazendo um filme e queria saber se você tem interesse em fazer os bastidores. É com o Mike Tyson’. Na hora em que ele falou ‘Mike Tyson’, quase tive um treco. Nem sabia se ia ter acesso ao Mike Tyson, mas fui igual a uma louca. Estava pronta para ir pro evento e larguei tudo e fui para os bastidores. A gravação era num estúdio aqui perto de casa e era um filme de combate, Kickboxer: Retaliation, em que o Werdum ia fazer uma cena de luta com o Mike Tyson. Eles me deram um lugar na frente para eu filmar, podia fazer todo o making of e talvez rolasse uma entrevista com o Tyson – que acabou não rolando. Mas me senti parte do filme: vi todos os ensaios, eles fizeram e refizeram a cena mil vezes, entrevistei o diretor, o Werdum e bati um superpapo com o Mike Tyson. Não rolou entrevista, mas rolou aquele encontro de bastidores que só Vegas proporciona, sabe? É um pouco da minha rotina aqui. Muita gente me pergunta como é isso de ser correspondente internacional. É assim: a gente vai no que vai aparecendo. Tem muitos momentos em que temos que produzir muita coisa, mas outras vezes as oportunidades aparecem e a gente joga tudo para que elas deem certo. Esse momento foi muito incrível. Mike Tyson estava ali, eu estava com o Werdum e tive acesso a um filme que nunca imaginei que teria, que nem sabia que estava sendo gravado.”

Brasil

Jorge Corrêa, editor-chefe do UOL Esporte

“Era 2012 e o Anderson Silva ia fazer a luta contra o Chael Sonnen [no UFC 148, em julho]. Coincidiu de a gente [Jorge e um colega do UOL] estar em Las Vegas no dia da final do Corinthians contra o Boca Juniors da Libertadores. Para eu escrever um texto sobre o ambiente por lá, a gente foi ver o jogo numa churrascaria brasileira, com os brasileiros. O Corinthians foi campeão da Libertadores, terminei a matéria e estava voltando da churrascaria, que era meio distante de onde estávamos em Las Vegas, quando, no caminho, recebemos a informação de que o Ronaldo estava na cidade. Ele tinha se aposentado no ano anterior e estava com a 9ine na época [sua antiga de marketing esportivo], atuando só como empresário. E tinha ido para Vegas para acompanhar a luta do Anderson, que era cliente dele. O Ronaldo ainda era megaimportante no Corinthians e a gente achou que tinha que encontrar ele. Então sai a gente caçando o Ronaldo pelos hotéis de Las Vegas. Pensamos que ele poderia estar no MGM, porque é onde todos os lutadores ficam. Fomos até lá e, putz, o cara não está. Continuamos caçando. Pensei: ‘Ele deve estar num hotel pica, sei lá, no Bellagio’. Quando estávamos indo pra lá, nos disseram que ele estava no Wynn ou no Encore, que são grudados [os dois resorts são da mesma rede]. Daí veio aquela dúvida: como a gente ia saber onde ele estava, o negócio é gigante, tinha dois hotéis pra procurar, dois cassinos enormes… Bom, pensamos em ir pra lá e ver o que conseguíamos. Entramos no Wynn pele porta principal, preocupados, e não é que ele está na primeira mesa de roleta, jogando, na boa, para comemorar o título do Corinthians? O assessor dele, o Cacá Ferreri, estava lá com ele. Nem acreditamos que tínhamos conseguido tão fácil. Negociamos com o Cacá e conseguimos as primeiras aspas do Ronaldo sobre o título do Corinthians. E isso foi graças ao UFC e ao Anderson. Depois foi só comemoração. A luta foi pica, o Anderson era atleta do Corinthians… A caçada foi muito divertida e no fim deu bizarramente certo.”

Thomas Gerbasi, diretor editorial do UFC

História 1: “Na verdade, são duas histórias que aconteceram na mesma noite no Hard Rock em Vegas em 2005 [no evento The Ultimate Fighter: Team Hughes vs. Team Franklin Finale, em novembro]. Não tinha seção para a imprensa, então eu acabei assistindo às lutas de um vestiário que tinha uma televisão. Da maneira como o ‘vestiário’ dos atletas tinha sido montado, o córner vermelho estava de um lado de uma cortina, e o córner azul do outro. Kit Cope, um renomado kickboxer, estava se aquecendo e dando chutes fortes no aparador [equipamento de treino]. O som parecia o de uma metalhadora. De repente, todo o local fica em silêncio e só se ouve são essas explosões. Kenny Florian, seu adversário, tenta se manter calmo enquanto se aquece, mas ele devia estar perdendo a cabeça. De repente, Cole enfia a cara entre a cortina e bota sua língua para fora. Todo mundo começa a rir e tudo volta ao normal. No mesmo dia, não é surpresa, Nick Diaz [que fez a luta principal] e sua equipe estão se estranhando com Diego Sanchez antes da luta. Eles são chamados para a arena, para a entrada, e é tão apertado lá que parece que a luta vai começar antes de começar de fato. Dana [White] tem que sair de seu lugar, ao lado do ringue, para avisar que, se eles lutassem lá, ninguém seria pago. Eles guardaram então para o octógono.”

História 2: “Estou em Vegas, após a pesagem de Conor McGregor para a luta de José Aldo [para o UFC 194, em dezembro de 2015]. A caminhada da Grand Garden Arena [no MGM Hotel] até os elevadores dos quartos leva geralmente três minutos. Neste dia, levou mais de 20, enquanto a multidão irlandesa ocupava o local, cantando e cantando o caminho todo.”

História 3: “Eu escrevo o livro Enciclopédia UFC e o editor faz uma noite de autógrafos para mim na Expo [espécie de feira de exposição que faz parte dos eventos da Fight Week]. Quem diabos vai aparecer para isso? Mas Laura Gilbert, da nossa produção, liga para todos os lutadores que ela sabia que estavam por perto e pede que parem no estande. Apareceu uma multidão enorme, vendemos uma tonelada de livros e eu não passei vexame de ficar sozinho com meu livro. A) Esse é o tipo de pessoas que temos e B) O tipo de lutadores que temos. Eu cobri boxe por 20 anos – isso não acontece no boxe.”

História 4:  “No dia em que assinamos com Brock Lesnar, ele estava em Cincinnati para o UFC 77 [em outubro de 2007]. Isso era secreto e chocante, as notícias nunca saíram. Eu e Jen Wenk [relações-públicas na época] fomos ao hotel para encontrar Brock e seu advogado, Brian Stegeman, para pegar citações dele para o material de imprensa. Eu tinha lido em algum lugar que ele tinha 1,82 m de altura. Eu tenho 1,82 m. Ele se levanta para apertar minha mão e é como se ele continuasse subindo. Eu disse: ‘Você não tem 1,82 m’. ‘Não, não tenho’, ele riu. Nunca tivemos um só problema com ele enquanto ele estava aqui e sempre cuidou de seus negócios.”

História 5: “São três, todas com BJ Penn. O retorno dele, depois de dois anos fora, foi anunciado no UFC 56 [que aconteceu em novembro de 2005]. Novamente, um grande segredo que não foi publicado. Eu o entrevisto nos bastidores e ele está bem, como sempre. De repente, ele levanta a camisa e tem outra camisa que diz ‘O campeão está aqui’. Não conseguia tirar o sorriso do meu rosto ou do rosto dele. Outra vez, eu estava conversando com um dos caras da produção do UFC no aeroporto na manhã seguinte a um evento sobre como nunca conseguimos encurralar BJ Penn, mas, uma vez que o fazemos, ele nos dá tudo o que precisamos e tudo é perdoado. Quando eu encontro BJ depois, digo isso a ele. Ele ri e fala que a minha namorada diz a mesma coisa. Por fim, já usei essa citação do BJ um milhão de vezes, e vou usar mais um milhão: ‘Há algo sobre BJ Penn que deixa as pessoas empolgadas. Você não sabe o que vai acontecer, mas alguma coisa vai acontecer. Ele pode desapontá-lo, fazê-lo feliz, fazer você chorar ou fazer você pular de sua cadeira, mas ele fará algo com você’. Em uma coletiva de imprensa antes de um evento, BJ parecia estar entediado. Peguei o microfone, li a frase para ele e perguntei se aquele cara ainda estava lá. Ele se iluminou e disse: ‘Ele está bem aqui’. O pessoal que estava lá enlouqueceu.”