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Uma mãe no Octógono

A fluminense Talita Bernardo, que faz sua quarta luta pelo UFC no Rio na véspera do Dia das Mães, conta como concilia a vida de atleta com a pequena Dominique

O coração de Talita Bernardo está acelerado. Prestes a lutar em um evento do UFC pela primeira vez no Brasil – e ainda no Rio de Janeiro, estado em que nasceu e no qual vive até hoje –, a atleta de 32 anos se diz cheia de energia. “Poder ter as pessoas que eu gosto e que me acompanham perto de mim dá um gás a mais”, conta ela no intervalo de um de seus treinos, que estão na reta final, para o combate com a campineira Melissa Gatto, em 11 de maio. O ânimo extra de Talita atende por um nome: Dominique. Como luta em casa, a faixa-preta de jiu-jítsu não vai precisar ficar longe da filha, que acaba de completar 6 anos, como geralmente acontece nas semanas de evento.



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A criança, aliás, está mais do que acostumada à vida no tatame – Dominique frequenta a academia desde os 4 meses de idade. “Quando ela nasceu, eu ainda não era lutadora. Eu só treinava jiu-jítsu”, conta Talita. “E eu a levava porque quis voltar a treinar 45 dias depois de ser mãe. Sempre frisei que, se escolhi ter um filho, tinha que só fazer as coisas em que ela coubesse ou coisas cujas consequências eu pudesse arcar. Vejo muitas atletas que são ‘mães de Facebook’, só para dizer que são, mas não criam. Nunca quis deixar minha filha para alguém cuidar para eu poder viver a minha vida – afinal de contas, ela foi superplanejada.”



Talita começou a lutar jiu-jítsu influenciada pelo marido, Josimar Junior. “Quando eu o conheci, ele era atleta, faixa-azul ainda. Como eu sempre gostei de esportes, me interessei pelo jiu-jítsu. Ele me inseriu nesse meio, fui treinando incansavelmente, indo em competições, me dando superbem… Mais tarde, por eu ter um nível de jiu-jítsu razoável, meu marido me pediu para ajudar uma atleta dele na parte de solo do MMA. Ele tinha o sonho de chegar com alguém no UFC. No começo não era eu”, relembra a lutadora. “Nunca tinha pensado em treinar MMA, mas devido a esses treinos diários, para ajudar uma companheira de equipe, acabei me sobressaindo, mostrando um lado que nem eu conhecia, nem eu acreditava. Foi tudo natural. Comecei a fazer lutas amadoras, depois fui pro profissional, as coisas foram acontecendo. As oportunidades foram surgindo e eu, só aproveitando.”

Talita conta que, nessa época em que começou a lutar MMA, Dominique tinha pouco mais de um ano. “Tudo na minha vida foi muito planejado”, explica a atleta. “Estou com meu marido já há praticamente 18 anos. Fizemos as coisas numa ordem cronológica pensadinha. O projeto era primeiro estudar, depois fazer faculdade, trabalhar, ter uma casa própria, casar e aí, sim, ter filhos.” Formada em educação física, Talita dava aulas em escolas – coisa que resolveu cortar quando entrou para o UFC. “Era tudo bem mais difícil antes, porque nos horários em que eu não trabalhava estava treinando – e ainda sendo mãe. Ficava supercansada. No UFC, como o nível é elevado, a dedicação tinha que ser maior. Então abri mão da minha carreira profissional como professora pra me dedicar a ser atleta profissional. Aí ficou até um pouco mais fácil conseguir conciliar meus horários de treinos com descanso na mesma proporção.”



Talita diz que ser mãe é a parte mais difícil de ser atleta. “Mesmo cansada, mesmo depois de treino, sou dona de casa, faço comida, cuido, faço dever de casa. Sou mãe em tempo integral, mas acho que consigo me sair bem nas duas tarefas”, afirma. A lutadora acredita que o maior perrengue da maternidade é a educação dos filhos. “Ter que falar não muitas vezes, mostrar o certo e o errado, arcar com algumas decisões que talvez seu filho não entenda agora… Nunca quis que ela fosse mimada, cheia de frescura e de manias. Tento criar como fui criada. Venho de família humilde e quero mostrar pra ela o valor das coisas, não o preço. Mas não existe nada como acordar todos os dias com aquele sorriso, ouvir um ‘eu te amo’, coisas que fazem tudo valer a pena. A Dominique já está acostumada com minha preparação, então nessa reta final ela fala: ‘Mamãe, você está sem comer, né? Está triste’. Ela mesmo já me ajuda, me abraça, faz carinho. Eu luto por ela. Talvez se eu não estivesse no UFC hoje eu não poderia proporcionar tantas coisas que posso, então tudo isso é tentando dar uma vida melhor para ela, podendo realizar alguns desejos que eu como criança não pude ter.”

Talita conta que pretende dar um irmãozinho para Dominique, provavelmente no ano que vem – como tudo em sua vida, ela está planejando direitinho. “Nunca escondi minha vontade de ser mãe de novo e de que minha filha vivencie o amor de irmão. Eu tenho uma irmã gêmea e mais dois irmãos, uma família grande, e queria que ela crescesse com mais alguém, uma companhia, um laço fraterno maior.” Enquanto isso, a pequena Dominique a acompanha tanto à academia que ela própria começou a treinar – e já é faixa-cinza de jiu-jítsu e participa de algumas pequenas competições. Se Talita quer que a filha siga seu caminho? “Se ela quiser vou apoiar, como fui apoiada por minha família, mas acho que não suportaria ver a Dominique lutando. Ser lutadora e mãe é muito mais fácil do que ser mãe de lutadora.”