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José Aldo Júnior, o rei humilde

 


Em um raro dia nublado na cidade do Rio de Janeiro, José Aldo chega cedo à academia Upper, no bairro do Flamengo. Tímido, ele se troca e vai para o octógono para o primeiro treino do dia - condicionamento físico. Após vários rounds fazendo sombra, socando aparadores e se movimentando no chão, é a hora de descansar até a próxima sessão.

O campeão peso-pena sobe para a área de tatames da Nova União, a famosa 'sauna', e se senta à beira do ringue. Ali, ele observa o treino de jiu-jítsu dos outros profissionais, enquanto mexe no celular. A capa do aparelho mostra uma foto sua, sorridente, usando uma coroa, um cetro e um manto vermelho. A cicatriz na bochecha, fruto de um acidente com uma churrasqueira na infância, reluz. Aldo conversa, faz piada, mostra vídeos engraçados, e olha a todo momento para os companheiros, verificando as técnicas, e corrigindo quando necessário.

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Ver aquele lutador agressivo, um dos maiores campeões da história do esporte, de maneira tão humana, causa certo estranhamento a quem não está acostumado. A verdade é que Aldo se transforma. No cage, ele é o rei. Fora dele, ele ainda é o garoto de Manaus.

Foi da capital da Amazônia que ele saiu quando decidiu que lutar seria sua vida, e o caminho até aqui não foi nada fácil.

"Ele me ligou falando que queria morar no Rio, se podia ir morar lá. Eu falei 'Lógico, que é isso, cara? Onde come um, comem dois'", relembra Marcos 'Loro' Galvão, companheiro de treinos de Aldo em Manaus que recebeu o lutador na capital carioca. "Eu tinha um patrocínio de R$100 na época, que dividia com ele. A gente dormia no tatame. Falávamos que queríamos voltar pra nossa cidade, porque era muito difícil. A gente passava fome! Tinha que acordar tarde, uma ou duas da tarde, para poder almoçar, porque não tinha o café da manhã. Quando todo mundo ia embora, só ficava eu e ele, na academia escura, suja. Tudo isso foi muito difícil, mas foi gratificante. Prevaleceu a força de vontade que ele tem, a garra, a determinação, tudo isso só fortaleceu ele. Ele sempre me falava que ia ser campeão. "

Dos tatames da antiga sede da Nova União, Aldo se mudou para as favelas cariocas - sempre ajudado pelos companheiros de equipe. Marlon Sandro, que hoje é um dos principais treinadores e presença constante no córner do atleta, o convidou para dormir em sua casa antes de suas lutas. Hacran Dias, peso-pena do UFC, também cedeu sua casa para ajudar o parceiro e proporcionar um mínimo de conforto a ele. 
 

Respira, irmão. Bota o coração que você vai ganhar" - Conselho de Aldo a Léo Santos na TUF Brazil 2 Finale.

Ele pega o metrô, anda à pé, não tem frescura" - Vivianne, esposa de Aldo.
Depois de anos recebendo tanta ajuda, o que o campeão faz é retribuir. Por isso a atenção aos parceiros de treino. Por isso a dedicação, o incentivo e a torcida. O Júnior, como é chamado pelos mais íntimos, está sempre apoiando aqueles que o auxiliaram no caminho até aqui.

Prova disso aconteceu em junho de 2013, quando Leonardo Santos finalizou William Patolino na final da segunda temporada do TUF Brasil e Aldo entrou no octógono aos prantos para abraçar o amigo. Léo relembra que, já exausto do combate, encontrou Aldo na plateia, e foram as palavras do amigo que o ajudaram a conquistar a vitória.

"Eu não estava vendo ninguém, só queria vencer o Patolino. Estava cansando, queria arranjar um jeito de vencer. Atrás do Patolino, quando eu olhei, eu vi o Júnior. Ele falou 'respira, irmão. Bota o coração que você vai ganhar'. Eu pensei 'não saio sem essa vitória'. Quando eu ganhei, veio a imagem dele. Quando eu pulei a grade - meu sonho sempre foi pular a grade - ele estava chorando. Foi muito espontâneo'. "

Hoje em dia, Aldo está longe de passar as dificuldades que passou antigamente. Mas isso parece não ter mudado em nada a personalidade do campeão dos penas. Quando conquistou o cinturão do WEC, ele comprou uma casa. Hoje, ele não esconde que luta também para dar uma boa vida para sua esposa, Vivianne, e a filha, Joana.

"Ele é um cara que não tem ganância. Não quer carro do ano", conta Vivianne. "Ele gosta de coisas boas, que todo mundo gosta, mas a gente não vai lutar pra vida toda. Ele vai lutar agora, mas um dia vai parar, e depois? A gente está preparando o terreno para depois, para viver a vida boa. A gente pensa no futuro, ele sempre tem o pé no chão. Ele pega o metrô, anda à pé, não tem frescura. Isso nunca vai mudar. "

12 de dezembro

O estilo de vida simples do brasileiro é bem diferente do de Conor McGregor, que gosta de ostentar com roupas de grife e carros de luxo. A luta pela unificação dos títulos acontecerá em 12 de dezembro, mas a expectativa pelo combate é alta desde o início do ano, já que, originalmente, o confronto entre eles deveria ter acontecido em 11 de julho.

Depois de uma turnê mundial intensa no final de março, que teve desde ataques verbais até McGregor roubando o cinturão de Aldo em uma coletiva de imprensa, Vivianne confessa que o marido ficou agitado com as provocações do rival, mas garante que agora a tranquilidade e o foco imperam.

"Na primeira semana depois que ele chegou da turnê, ele chegou acelerado, querendo treinar, acho que por conta do clima. Ele não está acostumado a vivenciar isso, não é de provocações. Ele não consegue fazer isso. Ele chegou acelerado, mas depois deu uma abaixada na poeira, e agora ele está mais tranquilo. Ele tem na cabeça que é só mais um adversário. Não importa se é Chad, se é McGregor. Ele vai fazer o melhor dele, e ele vai sair campeão. "

Sair campeão. Essa é a meta para este sábado, e para todos os outros sábados à noite em que Aldo pisar no octógono para defender o cinturão. Se McGregor luta pelo dinheiro e prestígio, Júnior tem outro objetivo, que envolve bem mais do que algo material.

"Quando eu entrei no esporte, eu queria deixar um legado muito grande. Eu não queria ser só mais um atleta ou só mais um campeão. Eu sempre pensei nisso. Acho que estou a caminho de ser tudo aquilo que eu imaginei, que eu sonhei em ser. Um dia, quando eu parar, aí sim eu posso chegar e falar 'agora esse é o meu legado'. Eu quero deixar um ponto de interrogação na cabeça de todo mundo. Quero que perguntem: 'se o Aldo estivesse aqui, o Aldo continuaria sendo campeão?' Um dia, quando eu sair do esporte, vou me aposentar, sendo o campeão. Aí sim eu vou deixar meu legado, deixar meu nome na história. "